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Associações portuguesas no Luxemburgo temem repercussões do caso CASA

© Casa asbl

O caso que envolve o Centro de Apoio Social e Associativo (CASA), uma das mais antigas associações portuguesas no Luxemburgo, veio intensificar o escrutínio sobre o setor associativo, num momento em que as instituições de solidariedade enfrentam desafios acrescidos.

As suspeitas de má gestão de pessoal e alegações de irregularidades, embora ainda por confirmar, geram um clima de incerteza para as associações portuguesas no país, especialmente aquelas que contam com financiamento público do Luxemburgo ou de Portugal.

Após inspeções realizadas pela Agência para o Desenvolvimento do Emprego (ADEM), a Inspeção do Trabalho e das Minas (ITM) e o Gabinete Nacional de Inclusão Social (ONIS), duas dezenas de contratos de Ocupação de Trabalho Indemnizada (OTI) atribuídos ao CASA foram suspensos, com efeito imediato.

Alguns trabalhadores, citados pela Rádio Latina, dizem ter recebido um telefonema da ADEM, no dia 15 de novembro, dando conta de que o seu contrato OIT (100% financiado pelo Estado) iria terminar no dia 18, na sequência das inspeções.

A decisão foi supostamente tomada devido a irregularidades apontadas na gestão dos contratos, como falhas no controlo de horas trabalhadas e na atribuição de férias.

Os trabalhadores afetados, muitos dos quais em situações de vulnerabilidade, ficaram sem emprego e sem acesso a subsídios ou segurança social. O impacto direto desta decisão levanta preocupações entre as comunidades imigrantes, para quem estas associações desempenham um papel essencial.

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José Ferreira Trindade com o grão-duque Henrique e o Presidente da República Portuguesa Marcelo Rebelo de Sousa

O presidente do CASA, José Ferreira Trindade, que é titular de uma comenda do Estado português, explicou à Rádio Latina que a ADEM propôs a troca dos contratos OTI pelos contratos de desemprego de longa duração, em que o CASA passaria a ser obrigado a avançar os salários, sendo depois reembolsado. Mas sem verba para pagar os 38 funcionários, o dirigente disse ter aceite esta proposta apenas para metade da equipa.

Pessoas que trabalharam no CASA apontam irregularidades graves na gestão do CASA, não confirmadas até ao momento. Poderia tratar-se da possibilidade de existirem projetos financiados por Luxemburgo e Portugal, ou má execução desses programas financiados, como poderia ser o caso dos cursos de línguas e informática.

As acusações continuam: o CASA poderá ter usufruído de financiamentos atribuídos para eventos ou projetos inexistentes assim como trabalho não remunerado.

Um ex-OTI do CASA revelou através das redes sociais que há pessoas a desempenharem funções em eventos e mercados durante horários extensos, sem pagamento adicional ou registos oficiais de horas.

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A sede do CASA asbl na Montée de Clausen na capital luxemburguesa

O silêncio dos governos de ambos os países é total, apesar de os executivos português e luxemburguês terem financiado repetidamente projetos do CASA.

A falta de reação de Portugal ou dos seus representantes diplomáticos tem gerado especulações quanto a um real apoio político às associações portuguesas no Luxemburgo, num momento em que o setor já enfrenta dificuldades económicas e regulamentares, disse um dirigente ao BOM DIA.

Os programas de reinserção laboral do Luxemburgo, como os contratos OTI e EMI, não estão em causa, mas encontram-se agora sob maior escrutínio. Após o escândalo do CASA e o recente caso de fraude de 60 milhões de euros na Caritas Luxembourg, a ADEM intensificou as fiscalizações às convenções que mantém com associações, o que pode dificultar ainda mais o acesso ao apoio estatal por parte de organizações que dependem desses programas.

A associação Bomdia.lu asbl, que detém o título jornal BOM DIA, foi também alvo de uma “visita” de responsáveis da ONIS, apesar de dispor à data de apenas um empregado em regime de OTI.

Para as associações portuguesas, esta situação significa operar num ambiente de maior vigilância, onde até pequenas falhas administrativas podem levar a consequências graves, como o cancelamento de convenções.

Muitas destas associações, já enfraquecidas pelas restrições da pandemia e pela nova lei das associações, temem que a atual crise possa resultar no encerramento de algumas instituições, disse o mesmo dirigente que prefere manter anonimato.

A comunidade portuguesa, que representa cerca de 20% da população do Luxemburgo, teme que as ondas de choque deste escândalo venham dificultar ainda mais a vida das associações que lhes prestam apoio. Com o aumento do custo de vida e a fragilidade económica de muitos residentes, muitas destas instituições desempenham um papel crucial na integração e no suporte às populações vulneráveis.

“É preocupante que uma má gestão numa única associação possa colocar em risco o trabalho sério de tantas outras”, afirma outro membro de uma associação portuguesa que preferiu não ser identificado. “Sem apoio do estado e com um escrutínio cada vez maior, estamos a enfrentar tempos muito difíceis”, lamenta.

O silêncio das autoridades de ambos os países aumenta os receios do mundo associativo no Luxemburgo. Enquanto o governo português continua a financiar projetos no Luxemburgo através da Direção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas, “a falta de declarações públicas sobre as alegações contra o CASA pode ser interpretada como um afastamento das preocupações das associações”, disse outro associativista ao BOM DIA, salientando que, por outro lado, as autoridades luxemburguesas têm optado por reforçar a fiscalização, mas sem fornecer garantias de apoio às associações que operam dentro das normas.

Num momento em que a solidariedade é mais necessária do que nunca, o setor associativo – em crise na diáspora há muitos anos – enfrenta agora o desafio de provar a sua transparência e eficácia num ambiente de desconfiança crescente.

A comunidade portuguesa no Luxemburgo aguarda ansiosamente por respostas, temendo que o atual clima de tensão acabe por enfraquecer ainda mais os alicerces de um dos principais pilares do seu suporte social.

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