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Mais um ano que passou

Cá estamos, amigo Martins. Gemendo e chorando, como a salve rainha. 

Em dias de maior aperto saudoso, esse sentimento tão único, tão português, a

pergunta mantem-se a mesma. 

“Onde estás tu agora?”

Não sei se tens acompanhado as notícias acerca do mundo, que às vezes me parece apenas uma enorme sala de espera, para a chamada final, de uma viagem sem regresso.

Desde que tu partiste amigo, as coisas não melhoraram. Antes pelo contrário, ficaram mais feias.

Faz-nos falta gente como tu.

Tu fazes-nos falta.

O teu sorriso, a tua gargalhada, a tua amizade. 

Fazes-nos falta por seres tu. A pessoa maravilhosamente imperfeita.

Estive em Portugal em Agosto.

Ocorreu-me perguntar onde jazem os restos mortais daquela que foi a tua casa, a que habitaste enquanto andaste ca por este mundo.

Mas depois pensei que, afinal tu estás em todos os sítios onde nos lembramos de ti, e não num só lugar.

Estiveste comigo e com os meus filhos, quando ao levá-los à piscina, ao passarmos em frente à tua fábrica, eu lhes falei, uma vez mais, de ti.

Estás comigo em alguns dos meus momentos de meditação, e também nos de oração.

Estás connosco quando conto a história do carro bloqueado. Lembras-te?

Saímos de casa a correr, porque estávamos sempre atrasados para aquele trabalho que arranjamos em S. João da Madeira, para nos ajudar nas despesas do curso de modelação de calçado. Aflitos porque sabíamos que iriamos chegar tarde, tão aflitos que quase nos acabávamos de vestir ainda pelo caminho.

Uma gola da camisa a descair sobre o lado esquerdo do peito e, a outra quase na orelha. O cinto das calças a tentar encontrar o seu caminho pelas presilhas. Os cordões dos sapatos a dançar à frente dos pés à medida que íamos tropeçando neles, quando ficavam debaixo do sapato esquerdo ao tentarmos levantar o pé direito.

E nesse dia, já dentro do carro, ao sairmos da rua onde tínhamos alugado aquele quarto que não tinha janelas, eu troquei os pés nos pedais, porque tentava calçar os sapatos em andamento. Bem sei que íamos ainda muito devagar, mas quando por engano eu carreguei no travão, pensando que carregava no acelerador, o carro parou repentinamente e batemos com a cabeça, eu no volante, e tu no tablier do carro.

– Uau…o carro bloqueou assim de repente.

Lembro-me bem da tua cara de espanto e ao mesmo tempo de confusão, ao dizeres isto.

-Bloqueou o tanas, fui eu que carreguei no travão ao invés de carregar no acelerador.

E depois de uns segundos a tentar assimilar o que se tinha passado na realidade, ou, à espera de acordar ainda, desatamos numa gargalhada que nos divertiu à brava quase para o dia todo.

Tenho saudades tuas, amigo.

Temos saudades tuas.

António Magalhaes

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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