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Gonçalo Santos lidera estudo internacional

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Um estudo internacional liderado por Gonçalo Santos, investigador do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), publicado na prestigiada revista Modern China, propõe uma nova explicação para a elevada taxa de cesarianas na China.

Até recentemente, os hospitais públicos, onde grande parte das mulheres chinesas dão à luz, não ofereciam a opção de anestesia durante o trabalho de parto vaginal e a cesariana era a única forma de escapar à dor inerente a este processo.

Neste estudo, este é um dos fatores apontados como uma das explicações para a popularidade da cesariana na China de hoje, mas não é o único. “Tal como em Portugal, a China está já há alguns anos no grupo dos países com a taxa de cesarianas mais alta do mundo, e a sua transição para esta condição foi um processo particularmente rápido”, revela o antropólogo e sinólogo do Departamento de Ciências da Vida (DCV).

“Na China, a taxa de cesarianas cresceu de 4,9%, em 1993, para 38,9%, em 2015–2016, bastante acima da taxa de 10-15% recomendada pela Organização Mundial de Saúde e acima da qual não há benefícios óbvios em termos de redução de mortalidade materna e infantil”, acrescentou.

Apesar do alerta da Organização Mundial de Saúde (OMS), entre 2010 e 2011, e do governo central chinês lançar uma série de medidas para reduzir a taxa de cesarianas, esta continua a ser uma das mais elevadas do mundo.

Como mostra o artigo de Gonçalo Santos e Jun Zhang, este fenómeno é causado por fatores estruturais relacionados com a orientação geral das políticas públicas de saúde maternal e com a forma como são geridos os recursos e as finanças dos hospitais com serviços de obstetrícia.

“A explicação, ainda hoje dominante, para a alta taxa de cesarianas na China aponta para uma subida na procura deste tipo de parto devido a uma melhoria generalizada das condições hospitalares para a realização de cirurgias. Por outro lado, ocorreu também uma mudança de atitude em relação ao parto, incluindo o facto das mulheres chinesas de hoje, ao contrário de gerações anteriores, não quererem passar pela dureza do parto vaginal e considerarem não ter idade ou aptidão física necessária para o suportar”, aponta Gonçalo Santos.

Esta hipótese do aumento da taxa de procura é um fator relevante, mas não suficiente, porque as escolhas das mulheres são sujeitas a condicionantes estruturais.

“A persistência da alta taxa de cesarianas da China deve ser explicada por fatores estruturais que têm a ver com a orientação geral das políticas públicas de saúde maternal e de gestão hospitalar. Para explicar esta persistência, na China ou noutro país qualquer, incluindo Portugal, não nos podemos limitar a fatores simplistas como variações nas taxas de procura”, considera o investigador da FCTUC.

“É necessário olhar mais fundo, para os fatores políticos e económicos que condicionam as escolhas e as preferências dos vários atores envolvidos no processo do parto com todas as suas incertezas, imponderáveis e imprevisíveis”, remata.

O artigo científico “The Rise in Cesarean Births and the Technocratic Medicalization of Childbirth in Late-Reform China” pode ser consultado online.

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