
A ameaça de Donald Trump de deportar 11 milhões de imigrantes deve ser levada a sério, por mais cruel e insensata que seja, e não diz apenas respeito a cidadãos latino-americanos, mas também a portugueses, muitos dos quais vivem, trabalham e pagam impostos nos Estados Unidos há muitos anos. De resto, Trump não perdeu tempo e começou logo a fazer deportações, assim que assumiu funções.
O contexto mudou relativamente ao primeiro mandato de Trump, que substituiu o slogan “construam o muro” por “deportação em massa”, tendo feito do combate à imigração uma das principais bandeiras da sua campanha, humilhando frequentemente os migrantes e associando-os à criminalidade, como sempre faz a extrema-direita, mesmo que não existam razões para o fazer.
Agora, neste seu segundo mandato, o presidente americano está mais livre para cumprir os seus objetivos, porque possui um poder sólido no Congresso e por ter nomeado pessoas fiéis com o perfil para os executar sem compaixão e que já tinham sido responsáveis na primeira administração por algumas das medidas mais polémicas contra a imigração, como Stephen Miller e Thomas Homan, este conhecido como o “czar” das fronteiras.
Como a extrema-direita sabe, o discurso contra os imigrantes rende votos, por mais falso e manipulado que seja. Nos Estados Unidos, como em Portugal, só que agora toca aos portugueses estarem na situação que os extremistas defendem para os estrangeiros no nosso país.
Os Estados Unidos tornaram-se um país muito mais xenófobo e racista, apesar da taxa de desemprego rondar apenas os quatro por cento. O que significa que os imigrantes que fazem parte dos 11 milhões são necessário para fazer a economia funcionar. Estimativas apontam para que cerca de 7 dos 11 milhões de indocumentados que a nova administração quer deportar estejam inseridos no mercado de trabalho, representando cerca de 5 por cento da força laboral, o que pode ter consequências catastróficas para vários setores de atividade e para o consumo nas comunidades locais. A xenofobia aumentou de tal forma, que não são apenas visados os indocumentados que desempenham trabalhos pouco qualificados, mas também os que vão para o país com elevadas qualificações. A polémica estalou recentemente, quando setores mais extremistas dentro do Partido Republicano contestaram a facilidade com que estavam a ser atribuídos os vistos H-B1, concedidos a imigrantes altamente qualificados e que tem sido muito utilizado por Elon Musk para captar trabalhadores para as suas empresas de elevadíssimo componente científico e tecnológico.
E é por todo este contexto que também a comunidade portuguesa nos Estados Unidos está a passar por momentos de grande ansiedade, como aconteceu no primeiro mandato de Donald Trump, quando abriu caminho à deportação de imigrantes pondo fim ao Programa DACA (Deferred Action Childwood Arrivals), uma medida implementada em 2012 pelo presidente Obama que protegeu da deportação várias centenas de milhar de imigrantes que chegaram em criança aos Estados Unidos e lhes permitiu viver, estudar e trabalhar legalmente no país.
Apesar da presença histórica dos portugueses nos Estados Unidos, que rondará um milhão e meio entre nacionais e lusodescendentes, e da relação transatlântica ser desde sempre um dos eixos centrais da nossa política externa, isso em nada significa que os nossos compatriotas estejam protegidos. Segundo responsáveis associativos, poderá haver alguns milhares de portugueses em risco de serem deportados, número difícil de precisar porque depende de diversos fatores, mas que é imperioso saber para que o Governo português faça tudo o que pode para minorar o impacto das deportações anunciadas pelo novo presidente dos Estados Unidos que, como já se viu, tem estado muito ativo na deportação de milhares de migrantes e na supressão de direitos que anteriormente existiam.
Paulo Pisco