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Teodora Cardoso, Carlos Moedas vs Leitão

© Raúl Reis / BOM DIA

Sempre que visito os meus templos gastronómicos preferidos em Lisboa, o Solar dos Presuntos e o Gambrinus, tenho por hábito flanar pós-prandialmente pelas ruas da incomparável baixa de Lisboa. Antes no entanto de prosseguir, sem pressa, para a Praça do Comércio, e de continuar o ameno passeio ao longo das margens do Tejo até Algés, uma paragem obrigatória é o alfarrabista que fica na rua das Portas de Santo Antão, praticamente oposto à entrada principal do Gambrinus.

São frequentemente esmagadoras as surpresas que aparecem na mesa à entrada, com dezenas de livros de enorme valor, relevância, qualidade, encadernação de luxo, conteúdo atual e, muitas vezes sem sequer terem sido lidos, oferecidos a 1 euro cada um!

Não é segredo que os herdeiros de figuras importantes da nossa praça, pessoas relevantes que constituíram bibliotecas notáveis ao longo da vida, se desfazem delas por “tuta e meia”, mal o familiar falece. Acredito que nem seja por necessidade de dinheiro, porque livros usados, que serão posteriormente vendidos a 1 euro, não devem sequer ser pagos pelo alfarrabista. Assumo que os herdeiros que se querem ver livre deles já se dêem por satisfeitos em não ter de os carregar para fora de portas!

Já encontrei livros neste “sebo” memorável da baixa com dedicatórias a Mário Soares, a Medina Carreira, a Freitas do Amaral, a Manuel Bobone, e ontem, surpresa das surpresas, à saudosa Teodora Cardoso, Presidente do Conselho de Finanças Públicas entre 2012 e 2019, o organismo responsável pela fiscalização do cumprimento das regras orçamentais em Portugal.

Estavam lá mais de uma dezena de livros que terão vindo da biblioteca dessa grande senhora, e que eu comprei (menos os repetidos, como o de Macroeconomia do Rudiger Dornbusch) para lhes dar um destino digno numa boa biblioteca universitária, ou então para entregar em mãos a quem eu sei que irá ter um enorme prazer em tê-los, e dar-lhes um bom uso prático.

Por exemplo, num artigo publicado há dias por Cavaco Silva e Carlos Tavares ficamos a saber que foi criada uma Comissão para a Reforma Fiscal (finalmente minha gente…). Se me disserem para onde posso mandar parte do espólio de Teodoro Cardoso, não me digam que não daria jeito aos integrantes da Comissão ter o livro “Paying for Progress, a new politics for Public Spending” da Commission on Taxation and Citizenship, ou o livro “Fiscal Policy, Taxation and the Financial System in an increasingly integrated Europe”, editado por Donald Fair e Christian de Boissieu, que até inclui contributos de Jorge Braga de Macedo e José Tavares Moreira.

Mas adquiri, para doar, outras obras memoráveis da biblioteca de Teodora Cardoso, verdadeiros pilares de conteúdos relevantes para os nossos responsáveis por política monetária, políticas públicas e reforma da administração pública, tudo temas que estão na agenda (com red flag) dos nossos governantes na atualidade, depois de décadas a dormir o sono dos justos à sombra da árvore das patacas dos fundos europeus. Fica aqui o convite, só preciso de moradas de envio…

Com dois enormes e pesados sacos de livros nas mãos, o passeio pelas margens do Tejo não chegou a Algés, fiquei-me pela Estação Marítima de Belém, onde os ombros claudicaram ao peso transportado (foram 8 km a carregá-los…). Mas deu, uma vez mais, para poder rogar (suaves) pragas a Carlos Moedas, que se está a revelar uma decepção como “mayor” de Lisboa.

Lisboa está a ficar uma cidade suja, descuidada, degradada, mesmo nas zonas que foram arranjadas, como a Zona da Ribeira das Naus, que recebeu a sede de dois organismos europeus (cujas fachadas e a envolvente estão degradadas e miseráveis ao fim de menos de duas décadas).

Passada essa zona, entre o Cais do Sodré e Alcântara, estamos em Terra de Ninguém. Minto, de grafiteiros e sem-abrigo. Armazéns em ruínas, antigos clubes e restaurantes abandonados. É isso que se deve entender pela ligação da cidade ao rio ? Quem é responsável por esses  quilómetros de amplos terrenos abandonados e com ruínas, a APDL ? Postos no mercado para construção de qualidade (habitação, comércio, escritórios, hotelaria, marina, instalações desportivas, zonas verdes de lazer e desporto, etc.) poderiam render uma fortuna, e contribuir a estabilizar o mercado.

Salvaguardadas as devidas proporções, o México teve Presidentes com visão e capacidade de realização, uns por amor ao país, outros, como um certo primeiro-ministro português, para encher os bolsos pessoais, da família, e dos amigos. Mas deixaram obra. Acapulco, Puerto Vallarta, Cancun, Bahias de Huatulco etc. todas elas tiveram processos simplificados de aprovações, expropriações, decisões, contratos com cadeias hoteleiras e construtoras, etc. que permitiram a urbanização de zonas de grande relevância turística com reconhecimento internacional dentro do sexénio do Presidente que apadrinhou o destino.

Precisávamos de ter alguém na Câmara de Lisboa (e concelhos limítrofes, como Oeiras) que desse uma volta monumental à miséria que é a ligação da zona urbana habitada com o rio. Sem sequer enterrar a linha do comboio, uma espécie de muralha chinesa entre os cidadãos e o rio, é possível fazer uma marginal urbanizado e cuidada de que Lisboa se venha a orgulhar.

Tomemos como exemplo Bilbao, onde uma única obra emblemática (Guggenheim) transformou para sempre uma cidade industrial suja e feia num destino privilegiado de atração turística, e tomemos como exemplo também os troços da nossa própria marginal onde essa transformação já ocorreu, como a frente rio do Maat (a única recordação boa que Mexia nos deixou), uma obra espetacular que mudou essa parte da marginal de Lisboa para sempre.

Carlos Moedas, mon ami, uma cidade como Lisboa precisa de um Presidente da Câmara com visão, capacidade de realização e proximidade aos cidadãos e aos seus problemas quotidianos. O parque construído para a Jornada Mundial da Juventude foi uma obra emblemática, que se usou uma vez para um evento, se usará esporadicamente para outros muito poucos, e cujo valor mais relevante para a cidade foi subtrair a interesses imobiliários espúrios uma enorme e cobiçada área de frente rio no Parque das Nações. Mas não chega.

Os lisboetas querem calçadas e ruas sem buracos, limpeza urbana, zonas verdes cuidadas, resolução do problema dos sem-abrigo cujo número subiu exponencialmente (e visivelmente), e uma genuína proximidade aos problemas reais (habitação…). Procure soluções que resolvam o problema dos boicotes legais da oposição (providências cautelares, pressão de ambientalistas pagos), e dos seus organismos satélites. E apareça na rua e nas redes (como Isaltino em Oeiras), seja visível aos eleitores, demonstre que está atento e sensível aos problemas dos habitantes da sua cidade. Se precisar de conselhos sobre comunicação aberta com o eleitorado, veja também com Isaltino quem o ajuda com as redes sociais. Caso contrário, a partir das próximas autárquicas passaremos, pelos vistos, ideologicamente, a “engolir” Leitão… Faço-me entender?

José António de Sousa

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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