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No Luxemburgo também se vai a ‘Fátima’ a pé

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Da capital do Luxemburgo ao santuário de Fátima em Wiltz, no norte do país, são pouco mais de 60 quilómetros, mas a distância parece mais longa aos portugueses que todos os anos fazem uma peregrinação a pé.

“É como ir da minha terra [uma aldeia perto de Coimbra] a Fátima”, disse Dulcina de Sousa, que há 22 anos não falha uma peregrinação no Luxemburgo e também aproveita as férias em Portugal, no mês de agosto, para ir à Cova da Iria a pé.

Às 06:30 da manhã Dulce, como é conhecida no grupo, está pronta para o “tiro de partida”: bandeira de Portugal às costas, lenço com a imagem de Fátima atado ao pescoço e bastões de caminhada nórdica, para ajudar no percurso.

É uma das veteranas dos cerca de 60 portugueses que esta manhã partiram da capital luxemburguesa, um dia antes da peregrinação anual ao santuário luxemburguês dedicado às “aparições” da Cova da Iria, e cumpre uma “promessa vitalícia”.

“O meu marido esteve muito doente, e eu converti-me a Nossa Senhora e prometi fazer a peregrinação [a Wiltz] até quando puder”, contou à Lusa a imigrante portuguesa, de 55 anos. “Um dia, se houver um problema e não conseguir vir, não sei como vai ser”.

Há dois anos, Dulce foi a estrela do documentário luxemburguês “A maratona da fé”, sobre a peregrinação dos portugueses ao santuário de Wiltz – construído após uma promessa feita no final da Segunda Guerra Mundial, altura em que as “aparições” eram populares na Europa.

O filme passou na televisão luxemburguesa e fez desta empregada de limpeza uma cara conhecida. “Houve luxemburgueses que me deram os parabéns e senhoras portuguesas que me disseram que choraram”, contou à Lusa.

Na estação de serviço escolhida para a partida, nos arredores da capital luxemburguesa, distribuem-se coletes refletores e bonés verdes, a cor do sindicato cristão-social LCGB, que presta apoio aos caminhantes.

“Os bonés podiam ser azuis, já que ganhou o Porto”, brincou Dina Nunes, que faz a peregrinação há quatro anos e garante que “ainda é um esticão”. “Se tudo correr bem, chegamos a Wiltz às 07:00 da noite”, antecipou.

A motivação para se meter à estrada “é a fé”. “Quando a gente está a precisar, é a fé que nos vale”, disse a imigrante, de 50 anos.

Lino Fonseca tem 34 anos e veio pela primeira vez, para pagar uma promessa. “Cumpriu-se, e agora tenho que ir”, contou o ribatejano.

Os homens estão em minoria no grupo de peregrinos, mas Lino Fonseca não é caso único.

De casaco da seleção nacional por baixo do colete refletor, Manuel Sousa também veio pela primeira vez, mas por causa de “uma aposta”: um amigo disse-lhe que “não era capaz, porque são muitos quilómetros”, contou o motorista de camião.

Com o sol a abrir clareiras no arvoredo que ladeia a estrada, distribuem-se as primeiras garrafas de água e ouve-se um grito: “A ver se a ovelha negra não fica para trás”.

A “ovelha negra” é Adelaide Cavaleiro, que há 20 anos faz o percurso a pé.

“No ano passado não consegui, mas ainda fui para lá de Bissen [a 27 quilómetros da capital]. Depois soube que estava com uma anemia”, contou.

A caminhada faz-se em ritmo acelerado, mas Irene Reis, de 70 anos, não tem medo de ficar para trás. “Nem que tenham de me chamar o carro-vassoura”, brincou.

“É uma caminhada que nos dá saúde e alivia o stresse. A gente deixa todos os problemas e vai só com uma intenção: a nossa fé”, disse a reformada, há 30 anos no Luxemburgo. “Gosto deste convívio. As pessoas cantam, rezam, conversam, partilham. São momentos de partilha”.

O santuário de Fátima em Wiltz atrai todos os anos entre dez a 20 mil imigrantes portugueses, mas resultou de uma promessa feita por luxemburgueses, muito antes da chegada dos primeiros portugueses ao Luxemburgo.

Na origem da sua criação está um voto feito por uma dezena de luxemburgueses em 13 de janeiro de 1945, numa altura em que a localidade do norte do Luxemburgo estava sob a ameaça de bombardeamentos alemães.

Com a chegada ao Luxemburgo dos primeiros portugueses, em 1968, iniciou-se uma peregrinação na Quinta-feira da Ascensão, feriado no Luxemburgo.

A romaria, na qual Marcelo Rebelo de Sousa participou no ano passado, durante a visita ao Grão-Ducado, converteu-se no “exemplo mais emblemático da presença portuguesa” no país, apontam os historiadores luxemburgueses Sonja Kmec e Michel Margue, no livro “Lugares de memória no Luxemburgo”.

Este ano, o bispo de Braga, Jorge Ferreira da Costa Ortiga, e o arcebispo do Luxemburgo, Jean-Claude Hollerich, presidem às cerimónias, que arrancam na quinta-feira às 09:30 e terminam com a procissão ao santuário e a cerimónia do adeus, a partir das 16:30.

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