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Não se destroem os heróis: a entrevista e as críticas a Cristiano Ronaldo

Quantos de nós, quando viajamos pelo mundo e dizemos que somos de Portugal, o que mais recebemos é um processo de identificação com o nosso país através do futebol.

Ao longo de décadas, são os nomes dos nossos jogadores que se diferenciam do padrão que servem de ponte para criarmos relações interpessoais e de empatia que nos facilita a adaptação a novas pessoas e novos mundos.

Quando chegamos a lugares desconhecidos do planeta, dizemos que somos de Portugal e nos referenciam Cristiano Ronaldo, sentimos um calor humano e sentimento de pertença tão confortável para nos aproximar dos outros e os outros de nós, que percebemos a importância e o valor que Cristiano Ronaldo tem para o país que nos deixa orgulhosos em ser Portugueses.

Cristiano Ronaldo é alguém que soube transformar o sofrimento e o sacrifício em superação, com consistência e persistência, em valor e diferenciação. Mudar de vida aos 12 anos atrás dos seus sonhos, com transições constantes, escalando na vida com as suas ambições e consequências, Cristiano Ronaldo é alguém que soube construir uma carreira que sabe que é curta, e transformar esse caminho em valor para uma longa duração. Empreendedor, empresário e dinâmico, não é por acaso que é o influencer no Instagram mais seguido do mundo, com quase 500 milhões de seguidores. As pessoas e as empresas sabem o valor da sua marca. O CR7 sabe o quanto custou o seu caminho, rodeando-se de pessoas like minded, que o expandem, nos contextos que encaixam com ele. Toda a sua trajectória mostra isso mesmo: que nada do que faz é de forma impulsiva sem reflexão ou estratégia ou bom aconselhamento. Porque ninguém vence sozinho, é preciso saber muito bem com quem estamos rodeados. 

Visão de lince é necessária para ver quem são os que estão no grupo ou saber afastar os abutres nas fases de sofrimento ou os interesseiros que não entendem que a vida para ser inteira é mais feita de dar, do que receber. Por isso é que é difícil manter uma gratidão permanente quanto mais sucesso se tem.

Os tempos não têm sido fáceis para CR7. A pressão que está envolvido pelos compromissos e responsabilidades assumidas, a quantidade de pessoas e marcas que dependem dele, mas, acima de tudo, as experiências recentes na vida pessoal, com a perda de um filho e o impacto que o drama desta realidade tem na vida de uma pessoa e numa família é dramático.

Na ordem natural da natureza, não se enterram filhos.

Ter gémeos, perder um filho no momento do nascimento, e a vida ficar apenas para a outra filha, traz um contraste emocional gigante, e uma obsessão expectável de cuidado com a Bella Esmeralda. O sofrimento dos pais acima de tudo, o impacto nas famílias-de-origem e a rede social íntima é o que suporta o processo de luto para aguentar esta realidade.

O não desistir, o querer continuar a jogar, a treinar, a manter a disciplina, a querer dedicar-se ainda mais à família, a cuidar de quem ama e a segurar todas as pontas para que o que construiu não se perca, é obra da resiliência e da rede de suporte que Cristiano Ronaldo tem.

Não conheço o Cristiano Ronaldo mas vendo o que vi e li até hoje, lidando eu com vários jogadores e atletas em fase de transição de carreira como a que Ronaldo atravessa ao longo de 22 anos de trabalho clínico, em consultas presenciais e online, percebendo a sua garra e vontade de vencer nítida, vejo uma pessoa que se conhece bem, que sabe o que quer e que nos seus momentos naturais de vulnerabilidade, se preocupa em aprender e superar.

Para esta superação das crises e fases temporárias, para ganhar e manter o valor permanente, veja-se que o Cristiano Ronaldo preocupa-se em estar rodeado dos melhores na sua arte, naqueles que sabem fazer, e acima de tudo, é exigente não só a procurar quem é experiente, mas quem tem ciência por trás, desde o apoio para a área física e médica, como para a área mental, como é o caso de ter convidado para o aconselhar e conversar de forma articulada e lógica sobre a sua vida, o meu brilhante colega psicólogo canadiano Jordan Peterson.

Ficar no banco, não jogar, os atritos das relações profissionais com o treinador e alguns ex-colegas, as críticas dos comentadores e treinadores de bancada e muita da imprensa que sabe que o sangue, suor e lágrimas vende, são tudo experiências que, acumuladas ao longo do tempo, satura, mói e dói. 

Com todo este conjunto de experiências vividas e sofridas, Cristiano Ronaldo percebe que não pode ficar mais calado com as versões que falam de si.

Ouvir e aguentar o que dizem a seu respeito e da sua família sem direito à sua verdade, ao longo de tantos meses a causar dano emocional, Cristiano Ronaldo, é humano e decide dar o “grito de Ipiranga”.

Esta entrevista a Piers Morgan foi a necessária para que a sua defesa de honra acontecesse. Com isso, CR7 escolhe, com um verdadeiro sentido de responsabilidade individual consciente e assunção das consequências para o bem e para o mal, dizer a sua verdade, o seu ponto de vista, partilhar o outro lado do que não se disse e não se sabia, mesmo tendo ficado muito por dizer.

Concordemos ou não, é um acto de coragem e de quem sabe que, os valores e crença de que temos que ser iguais a nós próprios, com verticalidade, valem mais do que o dinheiro e as realidades materiais. 

Cada um de nós é que sabe o que se passa na nossa vida. Falar e criticar a vida dos outros, principalmente sendo figura pública, é fácil e acarreta uma série de desinibições verbais, porque nunca trazem consequências. É por isso fácil dizer mal e criticar quem faz um caminho de diferenciação e de valor como o que fez e faz o Cristiano Ronaldo.

Não conhecemos o Ronaldo. Falar e criticar o que não se sabe, ver leigos analistas não habilitados e coaches de fim de semana a traçar diagnósticos de personalidade e de carácter de um homem que não conhecem, com quem nunca conviveram é uma forma menor de querer ganhar audiência.

Ver tantos outros a invejar e desdenhar o valor, desejando a queda de quem ainda dá tanto, é imaturo emocionalmente e não engrandece o desenvolvimento de cada um.

Com a personalidade que tem, Cristiano Ronaldo é o melhor jogador do mundo, porque “só” custou um caminho dos seus 12 aos 37 anos até agora. A arte e engenho de saber dar sentido ao sofrimento constrói o valor de cada um.

Quaisquer que sejam as consequências dos seus actos por esta decisão de fazer a entrevista, só o Cristiano Ronaldo vai arcar com as consequências e nunca nenhum de nós. Ninguém é perfeito e é preciso coragem para “dar um murro na mesa”, levar pancada e continuar a andar para a frente. Esta fase não define o CR7. 

Assim, vamos torcer para que o Ronaldo brilhe neste que, provavelmente, será o seu último mundial. Ele tem provas e resultados que mostram que é o melhor do mundo.

Não se destroem os símbolos de inspiração. Não se destroem os heróis.

Ivandro Soares Monteiro

Psicólogo Clínico & das Organizações doutorado

Psicoterapeuta Interpessoal Certificado | Professor Universitário @ICBAS

Fundador & CEO da EME SAÚDE | Associate partner CROWE PT

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