Há flores de manhã aos meus pés e só isso me faz sorrir. As flores fazem-me esquecer o pesadelo da madrugada.
Eu ia a uma vidente que se recusava a revelar-me o futuro. Era uma bruxa, que morava atrás de um caixote em madeira, daqueles caixotes velhos com que se acartava antes a fruta nos mercados, lia-me a sina em troca de 25 moedas. Eu ia morrer e já não me sobrava muito tempo. Eu escapara das outras vezes, mas desta vez não, eram o que diziam as linhas da minha mão esquerda, as cartas de Tarot, as runas, as estrelas, as borras de café, a bola de cristal, as vozes do entre-mundos e todo o coro dos fantasmas habituais da sua panóplia costumeira, que nunca erram quando erram e por tanto aí errarem sabem tanto, sabem tudo e não erram.
Acordei estremunhado. E chorei. O que há de pior do que chorar com pena de si mesmo?
Mas, como todas as manhãs, levantei-me, procedi às abluções matinais habituais e saí de casa. Ao sair, um chão de flores, caídas das árvores circundantes durante a noite, fazia de tapete por todo o pátio até ao portão. E eu sorri. Flores? Que bom augúrio, pensei.
JLC28062012
(in ‘Diário de A.’)