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Enfermeira portuguesa em Nova Iorque: estão a morrer demasiadas pessoas

Virgínia Ferreira, uma enfermeira portuguesa num dos maiores hospitais de Nova Iorque, diz que a sua equipa não celebra a cura de um doente de covid-19, porque “estão a morrer demasiados” pacientes infetados.

Virgínia Ferreira, paramédica durante mais de oito anos e enfermeira há seis, foi treinada em três dias para cuidar de doentes internados para o tratamento do novo coronavírus num campo universitário, um dos maiores sistemas hospitalares de Nova Iorque, que está a tratar centenas de pacientes por dia.

Os Estados Unidos tornaram-se na quinta-feira no país com maior número de infetados do mundo: atualmente, mais de 124 mil infetados com o novo coronavírus e 2.190 mortos, segundo a universidade Johns Hopkins. O número de pessoas curadas é de 2.612.

Segundo a mesma fonte, Nova Iorque concentra, no seu Estado, quase metade dos casos de covid-19 nos EUA. Por sua vez, a cidade conta mais de 30.000 casos confirmados e 672 mortes.

O local de trabalho de Virgínia criou mais uma unidade de internamento na semana passada, para novos doentes de covid-19. Era um espaço pediátrico, de onde tiveram de se retirar crianças. Virgínia foi treinada em três dias.

A primeira reação da enfermeira, quando descobriu que ia passar a prestar funções no hospital do ‘campus’ universitário, foi falar com o advogado e saber se esse pedido era legítimo. Virgínia rapidamente concordou em ir trabalhar, pelos pacientes e colegas que precisavam de ajuda, com a mentalidade de “apenas se preocupar pelos outros”.

“Enquanto isto acontecia, eu tive de treinar outras oito pessoas. Alguns colegas, em ‘outpatient setting’ nunca tinham tratado pacientes dentro do hospital”, acrescenta. Nos Estados Unidos, chama-se ‘outpatient’ aos tratamentos que requerem visitas pontuais ao médico e ‘inpatient’ quando os doentes ficam internados pelo menos uma noite.

A enfermeira portuguesa resume que o hospital universitário se depara com a necessidade de praticar “medicina de desastre”.

“Por trabalhar e viver em Nova Iorque, estás sempre preparado para grandes acontecimentos”, declara Virgínia.

“O 11 de setembro aconteceu aqui [em 2001] ou o furacão Sandy [em 2012], que paralisaram a cidade. Estás sempre preparado para os desastres. Mas os desastres externos são muito diferentes e a principal diferença é que esses têm um fim”, considera a enfermeira.

“O desafio com a covid-19 é que não existe uma linha temporal” acrescenta Virgínia, referindo que as estimativas apontam que o pico das infeções em Nova Iorque aconteça entre meados e fim de abril.

Nas salas de internamento, o medo e a solidão são os maiores problemas, considera a profissional portuguesa.

“Um dos maiores problemas que temos é que os pacientes estão isolados e estão a passar por algo que pode ser extremamente assustador. O paciente e a família estão muito assustados. Os doentes críticos estão lá sozinhos e morrem sozinhos”, conta.

Virgínia trabalhou com uma enfermeira que contraiu o vírus enquanto cuidava de um doente. A infetada teve de receber muito oxigénio antes da incubação e “o que acontece a estes pacientes é que eles estão bem até não estar; não há uma alteração gradual na sua condição de saúde”.

Segundo a profissional, a dificuldade para os enfermeiros é ajudar os doentes sem poder fazer uma avaliação visual, na tentativa de reduzir o tempo de exposição ao coronavírus.

“Estamos a confiar em monitores para saber se há pressão sanguínea ou se a frequência cardíaca é alta”, conta a enfermeira, enquanto lembra que não existe um monitor para cada paciente internado.

“No outro dia, depois de uma senhora ser compensada [com oxigénio], recebemos mais quatro doentes, dos quais dois tinham de seguir para incubação e requeriam oxigénio especializado. Nós não tínhamos monitores suficientes e acabámos por tirá-los aos pacientes que achámos que não estavam tão doentes”.

Sendo um hospital de grandes dimensões, a enfermeira diz que existem, para já, equipamentos de proteção individual suficientes, no entanto o mesmo não acontece para hospitais menores.

Virgínia diz que, no seu hospital, já está a ser pedido que as máscaras N95 – material de uma só utilização –, sejam utilizadas durante uma semana inteira, antes de serem recolhidas e esterilizadas novamente.

A enfermeira considera que o hospital universitário localizado numa das cidades mais afetadas do mundo é diferente de outros sistemas de saúde vigentes: um hospital académico que pode tratar uma grande parte da população, com hospitais comunitários afiliados em diferentes áreas da cidade, e que recebe muito suporte do Estado, ao contrário de outros centros médicos.

A portuguesa reforça o pedido de todos os profissionais de saúde nesta altura: que as pessoas fiquem em casa, prestem atenção às precauções indicadas pelos seus governos, lavem as mãos, não levem as mãos à cara e pratiquem distanciamento social.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 667 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 31.000.

Dos casos de infeção, pelo menos 134.700 são considerados curados.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

 

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