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Crónicas de Lisboa: bilhetes postais em tempo de Verão

No passado, nos tempos em que a compra duma máquina fotográfica, mesmo uma simples Kodak, não eram acessíveis às grandes massas e cada fotografia saía cara (máquina, o rolo de película, revelação do negativo e impressão em papel, inicialmente a preto e branco antes da invenção da cor), era muito comum adquirir-se os postais ilustrados dos pontos visitados. Serviam de imagens fotográficas dos locais visitados e poderiam ser remetidos pelo correio aos amigos e familiares: “Estou aqui”, e era a prova confirmada pelo carimbo e correio.

As máquinas fotográficas digitais, revolucionaram o processo de obtenção de fotografias, mas também já passaram à história, salvo poucas exceções, tal como adquirir bilhetes postais ilustrados, porque os telemóveis vieram permitir que cada um seja fotografo e, mais ainda, que cada um se fotografe a si próprio e, ato contínuo, enviar uma foto ou um “selfie” para dizer: “Estou aqui” ou, mais tarde publicar nas redes sociais: “Fui ali”. Vaidades com muitos excessos, porque, em muitas situações, o ego incha com o “estive” e não com o “usufrui”. “Só se vê bem com o coração, porque o essencial é invisível aos olhos” – no livro “O Principezinho” (livro maravilhoso, não apenas para jovens). Assim, eu diria que é necessário que a nossa “alma”, através das janelas que são os olhos, captem as imagens em nosso redor e não sejamos indiferentes aquilo que elas nos podem “transmitir”.

Assim, usando uma metáfora dos “Bilhetes Postais Ilustrados”, aqui deixo o que fui e vou vendo nas cidades e vilas deste país. Fotografo com o meu telemóvel e ou “capto” apenas para a minhas memórias.

Bilhetes Postais sobre a simpatia de alguma gente:

1) Um cruzeiro no Rio Douro – mais uma vez visitei a cidade do Porto, porque ali tenho sangue do meu sangue e, por isso, coração chama. É uma partilha, com as duas crianças, de um amor só explicável por quem é Avô de alma e coração. Há muito que lhe tinha prometido, ao mais velho, um cruzeiro turístico no Rio Douro chamado das “6 Pontes”, porque existem outras variantes de subir o rio acima ou descer o “rio de ouro”, para além dos barcos-hotel que também operam. Mas estes das “6 Pontes” duram menos de uma hora e partem ou da Ribeira do Porto, ou na zona ribeirinha de Gaia. Dirigi-me a um quiosque de venda de bilhetes e soube que o próximo partiria só daí a cerca de 40 minutos, horário que não me agradava. Para minha surpresa, a senhora sugeriu-me outro concorrente, com quiosque a três dezenas de metros e, disse mais, que tinham uma partida daí a poucos minutos e que ali as crianças até 12 anos não pagariam metade da viagem dos adultos, usual noutros operadores incluindo o da empresa que ela representava, juntei o útil do horário ao agradável duma despesa menor. Findo o cruzeiro, levei a criança ao seu quiosque para lhe adquirir um gelado e, simpaticamente, ela falou-me da viagem. Agradeci a amabilidade que ela teve para comigo e fiquei a pensar de que ainda há agentes económicos que não colocam o ganho acima de tudo.

2) A amabilidade dum “sinaleiro de transito” – estacionei a minha viatura num parque de estacionamento existente numa zona das Caves de Vinho do Porto, inserida num grande projeto “económico-turístico” chamado de WOW Porto (WOW: The World of Wine – O Mundo do Vinho; algo tão complexo na sua plenitude e de relevante importância socioeconómica e que o WOW pretende mostrar com os seus seis museus e outras estruturas) e “perdido” naquelas ruelas agora de sentido único, pedi ajuda a um profissional da distribuição. Prontamente e sem sair da sua carrinha, lá me indicou o caminho. Para minha surpresa, no local onde eu poderia hesitar no percurso, depois de eu ter operado uma inversão de marcha, lá estava ele, fora da sua carrinha e de bata branca – seria distribuidor de pão, a indicar-me o caminho a seguir, como se fosse um “sinaleiro de trânsito”. Inacreditável a prestabilidade daquele homem um pouco mais novo do que eu. A afabilidade e disponibilidade dos portugueses, em geral e muito os portuenses, em especial, era um dos pontos fortes que os turistas sublinhavam e valoriavam. Contudo, agora com as aplicações turísticas nos seus telemóveis, já não precisam da nossa ajuda. Eu, por exemplo, oferecia-me para os ajudar, porque sentia pena deles quando os via perdidos nas ruas e avenidas ou com dificuldades em se orientarem através dos mapas das cidades. Outros tempos estes.

Bilhete Postal Ilustrado com os arrumadores e os “sem-abrigo”

1) O sono dum “sem-abrigo” – numa tarde de domingo, já com temperatura do Verão de Agosto, ali nas escadas laterais da Praça de D. João I (praça e estátua dedicada ao Rei D. João I, Mestre de Avis, (1357-1433), dormia um sem-abrigo enrolado num cobertor…Era domingo e quer os cidadãos portugueses (turistas ou residentes) quer os muitos turistas estrangeiros (e já são muitos, mas ainda muito longe das “enchentes” de antes da pandemia), que por ali passavam, aquele corpo ali enrolado não “mexeri” com a sensibilidade de cada um. Os “postais turísticos”, agora convertidos em “selfies” com muita vaidade à mistura, não são “manchados” com a captura das imagens destes humanos “deserdados da vida” e que nem as autoridades minimizam, “assobiando para o lado “- “assobia para o lado “, canção que vamos ouvindo na rádio neste Verão. É isso mesmo, vamos limpando os nossos pecados coletivos com uns tostões que doamos e com alguma ação caritativa das autoridades, sejam do Governo Central, local e de instituições, principalmente pelo Natal… “Não lhes dês o peixe, mas ensina-os a pescar”.

Pelas ruas das nossas cidades, principalmente nos “centros históricos” circulam e “habitam” muitas centenas destes humanos alguns caídos também na desgraça do alcoolismo e das drogas que os leva à morte prematura.

E os denominados “arrumadores de carros” continuam a ser um triste “postal turístico” das nossas cidades e vilas e em pontos turísticos. Salvo raras exceções, a colheita que vão fazendo, e que quase todos os automobilistas acabam por ceder, porque sentem medo se nada” contribuírem”. É mesmo isso, são obrigados a “pagar uma taxa de pobreza ou de alimentação de vícios” (dizem que assim não praticam roubos!) que, na maioria das situações se destina a consumos de álcool, drogas, etc. Confesso que só em última instância estaciono o meu carro em “zona de arrumadores”, preferindo outros locais. Sinto um “desconforto” com a existência destes “pedintes à força” e culpo as autoridades por nada fazerem, tal como os “sem-abrigo”. Há problemas que só se resolvem com medidas concretas, mas os responsáveis preferem assobiar para o lado. Verdade seja dita que se aplicassem medidas “draconianas” lhes cairia em cima o Carmo e a Trindade”.

Voltarei, proximamente, com mais “bilhetes postais” sobre o meu país. Estes aqui apresentados e os outros que publicarei, são diferentes dos muitos bilhetes postais clássicos que tenho no meu baú de memórias.

Serafim Marques

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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