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Conversas de viagens

Estava eu nas últimas páginas do Alquimista, de Paulo Coelho, a pensar qual o livro que iria ler a seguir, quando o Post Man trouxe uma encomenda que vinha de Portugal. Palmela, para ser mais preciso.

Apalpei o envelope almofadado e percebi logo que era um livro.

Há anos que digo isto, principalmente à minha família. “O melhor presente que alguém me possa oferecer é sem dúvida alguma um livro.

O autor, deste livro que viajou um longo caminho, desde Palmela Portugal, até Sheffield, Inglaterra, (e só menciono o país porque também existe Sheffield, Estados Unidos) é Elmiro Barbeiro.

Conversas de Viagens – Contos, Histórias e Poemas.

As promessas são para se cumprir. Nem que às vezes, por circunstâncias da vida, demorem longos anos a serem concretizadas.

Por vezes uma promessa para ser cumprida não depende só da pessoa que se comprometeu. É preciso um conjunto de fatores e pessoas, outras pessoas, que ajudem a concretizar a promessa.

Querendo, o universo conspira no sentido de a promessa ser realizada, mesmo que por meios por vezes misteriosos. (Afinal o Alquimista sempre serve para alguma coisa).

Diria que foi o caso do autor, Elmiro Barbeiro, que ao fim de muitos anos edita este livro, promessa feita a seus pais.
O universo, e Deus, que será o Maestro divino da criação, lá se encarregaram de selecionar ao longo dos anos, as pessoas certas, e as circunstâncias adequadas, para que a promessa feita acabasse por ser cumprida.

O livro é um conjunto de histórias, contos e poemas, mas acima de tudo uma viagem por memórias de factos que foram marcando uma época e uma maneira de viver, que como pedras fundamentais de alicerces bem seguros, edificam a maneira de ser de um povo que dá identidade única ao nosso país, e à nossas regiões, neste caso a região Transmontana, Concelho de Freixo de Espada à Cinta, e que fazem de nós um povo como não há outro igual.

Através destas histórias e poemas é como se se lessem as rugas de um povo que resiste e persiste, rugas essas que como livros abertos descrevem uma vida das dificuldades de outros tempos, bem mais duros, mas mais sólidos também, e ao mesmo tempo as alegrias e os bons tempos de farra e convivência.

Uma viagem por uma região de paisagens deslumbrantes, paisagens de cortar a respiração por vezes, onde nós que somos parte do universo e da natureza que embeleza o planeta terra, não ficamos indiferentes quando os elementos que compõem a montanha, pressentem os minerais que fazem parte da nossa constituição humana, e a conexão se faz.

Alguém que faça uma viagem pelas lindas e deslumbrantes terras Transmontanas e não sinta essa conexão, que por vezes se manifesta numa espécie de formigueiro na barriga, então não é humano.

Apesar dos poemas, contos e histórias, o livro tem um conjunto de fotografias que comprovam o que aqui se diz.

As paisagens de Lagoaça, o Miradouro da Cruzinha com vista para Espanha, a estação dos caminhos de ferro de Mogadouro, Carviçais, Palácio dos Areias em Lagoaça etc.

Um livro que me traga um sorriso ao rosto quando o leio, para mim já é um bom livro.

Este livro não só me trouxe esse sorriso, como também me avivou algumas memórias Transmontanas.

Uma viagem a Vila-Real de Trás -os- Montes, uma ida a Ribeira de Pena, mais propriamente uma localidade chamada Azeveda.

Ao ler este livro de Elmiro Barbeiro foi como se estivesse a ver uma vez mais o povo de Azeveda. Como se ouvisse de novo as suas vozes e a sua maneira calorosa de receber.

Um caminho pedestre de onde as pedras pareciam nascer do solo, formando uma espécie de escadas irregulares sobre uma encosta ingreme que nos guiava a uma casa isolada, a meio da colina. A casa onde moravam as primas da Azeveda.

Ao ler este livro de Elmiro Barbeiro recuei no tempo mais de trinta anos e lembrei-me destas primas da minha mãe, assim como do povo da aldeia, no sopé da colina.

Povo que me parecia dimanar da terra, “com a verticalidade das rochas” (Miguel Torga) e por isso também, único, genuíno, cheio de história e tradição. Povo de um calor e de uma humanidade de fazer comover o mais indiferente.

Povo que saiu à rua para nos receber como se fossemos também filhos da aldeia.

Alguma desta gente bonita eram primos e tios da minha mãe, outros, crianças outrora amigos de brincadeira que cresceram juntos até que a juventude e as aspirações os fizeram mover em diferentes direções.

Memórias de uma jovem velhinha de fibra Transmontana, madrinha da minha mãe, e que aos 97 anos de idade ainda ia, toda despachada, ao monte, arrecadar lenha para o lume.
Recusou-se a morrer na cama.

Aos 102 anos de idade, uma manhã, sentou-se no sofá, encostou a cabeça para trás, e partiu assim.
Aposto que deve ter dito aos anjos que a vieram buscar, – uma viagem longa faz-se sentada e não deitada.

Por culpa da minha mãe, natural de Vila-Real de Trás-os-Montes, o meu pai, nascido e criado em Felgueiras, distrito do Porto, ficou a ser conhecido desde que regressou da sua aventura no grande hotel de Vidago, e do colégio de Vila-Real, e de lá trouxe a minha mãe para Felgueiras, como o senhor Vila-Real.

Por culpa deste livro, Conversas de Viagens, lembrei-me agora de tudo isto.

Conversas de Viagens – Contos, Histórias e Poemas, de Elmiro Barbeiro, nascido a 20 de Setembro de 1948, em Lagoaça, Concelho de Freixo de Espada à Cinta, tem o prefácio de Armando Palavras, Professor, doutorado em História, Investigador.

E é precisamente com o último parágrafo do prefácio deste livro que termino esta minha crónica.

“É um livro de memórias fragmentárias. Nelas o autor reencontra os seus ancestrais em momentos da meninice e segue ligeiro por várias fases da vida: a passagem pelo Seminário dos Dehonianos, a vida de Marçano no Porto, a frequência no Colégio de Carviçais, o Curso Geral do Comércio em Bragança e, finalmente, a recruta e o serviço militar cumprido na Guiné, para onde viajou no paquete Uíge.
E se a poesia é uma das suas paixões, com ela encerra com chave de ouro este volume.

Armando Palavras
Oeiras, Dezembro de 2020”

António Magalhães

 

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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