De que está à procura ?

Colunistas

Beijos roubados

The Kiss

Roubaram-nos beijos
namoros, namoricos,
xoxos, cortes, curtes e flirtes
carícias, delícias, delírios
e até, por ventura, orgasmos

sem puberdade nem adolescência
maluca e inconsequente
ali ficámos nós e a nossa inocência
que finalmente nos salvaria
bem mais tarde

recusaram-nos corpos e peitos
e camas e bancos traseiros
e praias e prados a rebolar
extraviaram-se mãos e dedos
sei lá por onde, não aqui,
não em mim nem em ti

e nós, sempre pacientes
aguardando a chegada desse paço
admirável, prometido, anunciado
como nos contos de fadas
nós, sempre bem comportados
como nos ensinaram a ser
silenciosos, virtuosos,
mudos e calados
fielmente expectantes
na fila da felicidade
sem resmungar nem bufar
sem actos ou desacatos
o menino-bolha, a menina de vidro

mas o que aguardávamos com ânsia
acabou por nunca chegar
restou-nos atravessar corajosamente
o cais para o outro lado da realidade
e as noites brancas, tantas e inócuas
que não nos encherem de gozo
tão somente rasaram de águas e vazios
os nossos olhos e corações
e os despertares inanes desaguavam
quase sempre em passeios ausentes
por manhãs baças e lassas
e dias desprovidos de sentido
escorreram as horas infindas
esgotaram-se os anos e os lustros
e o facho da esperança quase extinto
na noite de bréu-labirinto

Mas tu e eu
sempre fomos bem mais
do que tu e eu
e hoje somos ainda mais
do que apenas tu e eu
bem sabes, o fruto do nosso fruto

e sermos isso tudo deu-nos alento e força
pujança, vigor, vida, ousadia e vontade
rejeitámos o porvir que nos desditaram
porque nós, meu amor,
abundamos de luz e ela doura
com e sem literatura
e com uma tal latitude e prodígio
que inventámos a nossa própria verdade
essa que nunca quis acontecer
mas vergá-mo-la e ela não teve como
senão obedecer.
Porque a puta da felicidade,
essa miragem que todos fitam
na direcção errada,
não se espera nem se aguarda,
constrói-se e merece-se, foda-se!

Vem meu amor,
juntos esqueceremos
as nossas mãos estendidas
sempre abertas para os outros
mas quando pediam carinho
era esse grande e generoso nada
que nos era dado como esmola.

Meu amor, não chores, aquieta-te em mim,
olvidemos o desamor e o desrespeito
as mentiras, as traições, o torpe e o sórdido,
o ultraje, a vileza, a infâmia e o exprobro.

Vem viver comigo todos os instantes
vem viver comigo os momentos sequestrados
vem viver tudo, temos a vida inteira
vem agora, meu amor, que eu quero
todos os teus beijos
e todos os teus abraços
e todos os teus desejos
e todo o teu corpo no meu
e tudo e tudo e tudo
sempre.

JLC26042019

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

TÓPICOS

Siga-nos e receba as notícias do BOM DIA