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As histórias portuguesas da batalha de La Lys em documentário

Felícia de Assunção, Leonilde Milhões, Raymonde da Silva e Claude Correia são os protagonistas do documentário “Les Héritiers de la Bataille de La Lys”, de Carlos Pereira, que quer lutar contra o esquecimento da participação lusa na Grande Guerra.

O filme vai estrear a 5 de novembro, numa projeção na Université Populaire d’Histoire de Pessac (Unipop Histoire), perto de Bordéus, e resulta de 12 anos de reportagens nas terras francesas onde os portugueses combateram há um século e em Murça onde o soldado Milhões é aclamado como um herói.

“O objetivo é mostrar o filme aos portugueses de França para que mostrem aos franceses que os portugueses participaram na Primeira Guerra Mundial. Esta relação entre a França e Portugal não é conhecida. Acho que é algo que está esquecido e não se percebe muito bem porquê”, explicou à Lusa Carlos Pereira.

No documentário, Raymonde da Silva, que já morreu, conta, por exemplo, que foi presidente da câmara de uma terra francesa “por ser a filha do português” que tinha combatido na Grande Guerra e também recorda como foi buscar a terra natal do pai para a sua campa.

“Ela foi à procura da terra do pai, junto a Lamego, foi lá buscar um saco de terra, trouxe e pôs em cima da campa do pai. Isso é uma coisa que me fez arrepiar quando fiz esta entrevista. Ela, aliás, até diz que quando chegou a Portugal apetecia-lhe beijar a terra como o Papa costuma beijar”, descreveu o também diretor do semanário luso-francês Lusojornal.

O filme dá, ainda, voz a Claude Correia, que também já morreu e que lutou na Segunda Guerra Mundial depois de o pai ter estado nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial.

Leonilde Milhões, filha do soldado Milhões, e que também já faleceu, conta que “o pai recusou a metralhadora que lhe queriam dar quando regressou a Portugal porque essa ‘menina’ já a tinha aturado muito tempo” e recorda que ele tinha apenas uma pensão de guerra de 15 escudos, apesar do estatuto de herói.

“Ela conta que ele foi pedir para o filho não ir para o serviço militar e perguntaram-lhe se ele não tinha vergonha, ele que andou na guerra. Ele disse que necessitava do filho para trabalhar no campo porque só tinha 15 escudos por mês”, explicou Carlos Pereira.

O realizador sublinhou que o soldado Milhões, como a generalidade dos portugueses que participaram na Primeira Guerra, eram “analfabetos, foram arrancados aos campos, às terras onde eles estavam, sem saber onde era a França”, algo que é sublinhado no filme pelo historiador Nuno Gomes Garcia.

Outra filha de um soldado luso a intervir no filme é Felícia de Assunção Pailleux, hoje com 92 anos, e que nas últimas quatro décadas tem levado a bandeira de Portugal para as cerimónias anuais no cemitério militar português de Richebourg e no monumento aos mortos em La Couture, em França.

“Ela diz no filme que quando ela está ali, o pai está ali com ela porque aquela bandeira era a bandeira do pai”, continua Carlos Pereira sobre a também porta-estandarte da Liga dos Combatentes que, este ano, foi condecorada pelo Presidente português Marcelo Rebelo de Sousa com a Medalha da Defesa Nacional.

Há, ainda, a história de João Marques que nos últimos 28 anos se tem ocupado do cemitério de Richebourg, onde estão as campas de 1.831 soldados lusos, e que também foi condecorado, este ano, nas cerimónias do centenário da Batalha de La Lys, com a Medalha da Defesa Nacional.

Radicado em França há 34 anos, Carlos Pereira começou a trabalhar, em 2005, sobre a participação do Corpo Expedicionário Português (CEP) na Grande Guerra, mas só em 2006 começou a filmar as comemorações anuais da fatídica Batalha de La Lys para reportagens difundidas na RTP e na SIC Internacional.

O jornalista passou a infância em Murça a ouvir histórias do soldado Milhões e apesar de não ter familiares que foram para as trincheiras da Flandres francesa, deixou-se cativar pelo tema, guiado por Afonso Maia, um especialista da Grande Guerra e neto de um soldado do CEP, a quem o filme é dedicado.

“O filme é dedicado à memória do Afonso Maia. Escrevemos o filme juntos inicialmente e como acabámos por não o fazer – ele morreu há uns anos – este é um filme que vem substituir aquilo que nós tínhamos pensado fazer. Aos 50 anos, ele descobriu que o avô tinha andado a combater no sítio onde ele morava”, contou Carlos Pereira sobre o homem a quem Marcelo Rebelo de Sousa também atribuiu, este ano, a título póstumo, a Medalha da Defesa Nacional.

No documentário, há, ainda, entrevistas ao historiador e antigo ministro da Defesa Nuno Severiano Teixeira, ao ex-ministro da Defesa, Azeredo Lopes, ao jornalista e escritor José Rodrigues dos Santos, ao historiador Georges Viaud, ao presidente da Liga dos Combatentes e tenente-general Joaquim Chito Rodrigues, entre muitas outras personalidades.

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