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A história da minha ida ao Grande Assalto

Vou-lhes contar a história do meu assalto a Tancos.

Eu trabalhava num bar e um dia servi uma “Cuba Libre” que, como sabem é um cocktail feito á base de rum e cola e limão. Nada de mais se eu tivesse usado no cocktail refrigerante de cola ao invés de ter usado mesmo cola, daquela cola que é capaz de colar cientistas ao tecto. Mas sou capaz de jurar pela alminha da minha vizinha de cima (boa como o milho) que, no tutorial que eu segui no youtube, usaram mesmo cola! Com isto tudo, é claro que o cliente não ficou colado, quero dizer, fidelizado ao bar e eu, claro está, fui despedido e lá tive que regressar à casa do meu avô. Fui então lá para o terreno anexo à casa balouçar-me num tronco que lá temos para quando fazemos asneira e somos despedidos! Estava no bem bom, balouça para cá, balouça para lá, quando chegou o meu avô Aníbal com o jornal que trazia o anúncio do assalto:

“Precisa-se de ladrão que assalte muito e depressa!”.

E diz a minha avó, “porque é que tu não respondes a esse anúncio?”.

E diz a minha mãe, “isso, isso o que era preciso era comprar-lhe um carro!”.

E diz a minha tia, “mas eles na gatunagem dão carros”.

E diz a minha mãe, “pois, o meu filho vai agora para um assalto montado num carro que os outros já montaram, sei lá quem é que já andou naqueles carros!”.

Fomos a um stand de carros, mas não vendiam carros eléctricos, só a diesel, e a minha mãe disse, “o meu filho não vai agora para o assalto encher o assalto com CO2… O meu filho, vai a pé mas vai limpo, sem poluir o ambiente, caraças”.

Fomos para casa, pedi uma pizza com extra-queijo para o caminho, chamei um Uber e fui para o assalto. Cheguei ao assalto devia ser para aí meia-noite, estavam os Paióis Nacionais ainda fechados. Estava também uma mulherzinha a vender Palha de Abrantes à porta do assalto e eu perguntei, “minha senhora, faz favor? Diga-me, é aqui o grande assalto?”.

E a senhora disse-me, “não! É mais acima! Aqui é a divisão ‘Pequenos Roubos’ para os novos recrutas”.

Repliquei um, “muito obrigado”.

Subi a escala de intensidade de gatunagem. Cheguei lá cima, e estavam já a abrir as portas gradeadas do grande assalto, já eram uma e tal da manhã, e o sentinela perguntou-me se eu vinha ao anúncio, e eu, disse que sim, e perguntou ele, “e assaltas muito e depressa?”. E eu disse, “por enquanto ainda assalto assim-assim… preciso de treino.”

Respondeu-me, “então anda ao capitão”. Fomos ao capitão, e o capitão perguntou-me se eu trazia o pé de cabra ao que eu disse, “não, pensei que a ferramenta davam cá vocês. O que eu trago é uma máscara, que um vizinho meu guardou como recordação do “assalto do século” ao comboio postal entre Glasgow e Londres”.

E diz o tenente, “como é que você assalta só com uma máscara?”. E eu expliquei, “coloco a máscara, e depois, vou lá a correr buscar o material de guerra”,

Aí diz o capitão, “e pensa que assim fica feito o grande assalto é!?”.

Diz o sargento, “olha, nós podemos dar uma ajudinha!” E diz o capitão, “pois, com certeza não seria nem a primeira vez nem a última que ajudávamos um ladrão a ‘limpar’ as nossas instalações!”

Bem, fizeram uma conferência e deram-me a chave dos paióis, um camião e colocaram à minha disposição o batalhão de Tancos para me ajudarem e depois mandaram-me fazer o “grande assalto”!

Estava então eu, a assaltar muito direitinho, com a ajuda do batalhão de Tancos, quando veio o capitão e mandou-me ir vestir de Director desta coisa toda. Deram-me uma farda cheia de penduricalhos, crachás e divisas, enfiaram-me um barrete na cabeça e mandaram-me para o Ministério da Defesa. Cheguei ao Ministério da Defesa, bati à porta e o sentinela espreitou pela frincha e perguntou, “quem é?”. E eu, “sou o Director desta coisa toda”, malandrice!

Ele disse, “o que é que queres?”. E eu disse, “eu venho cá avisar que houve um roubo em Tancos”. E ele disse, “trabalhas em roubos há muito tempo?” E eu disse, “trabalho desde a meia-noite, mais ou menos!”.

Respondeu-me, “é impossível ter havido um roubo! É impossível ter havido um roubo! É impossível ter havido um roubo!”.

Eu não achei graça àquilo, e fui fazer queixa ao capitão dele, o Costa. O capitão dele disse-me, “deixa lá que ele é burro, almoça cá ca gente!”.

Bem, almocei na cantina de S. Bento. Aquilo é que era um luxo. Comemos uma dúzia de lagostas muita grandes e voltei para o meu assalto. Estava a contar isto ao meu capitão, quando entra um soldado a correr, “meu capitão dá licença?”

Perguntou, “o que é?”. Disse o soldado, “fomos roubados!”. O Capitão nada surpreendido, “e o que é que nos roubaram?”. Respondeu-lhe, “não sei porque o inventário não estava feito, mas entre sucata e armas ainda levaram umas coisitas meu capitão!”.

“Esquece isso e conserta mas é a rede para as galinhas não fugirem”.

“Mas meu capitão…”.

Nos quartéis há soldados teimosos, a gente bem que os quer puxar para o lado da gatunagem para eles não vêm. Feitios não é?

Aí o meu capitão disse, “já que estás tão teimoso, vai fazer imediatamente o inventário do material que foi roubado e também das Playboys e das Ginas que existem nos paióis de Tancos”.

E como o pobre rapaz ficou verde que nem um pepino com a ordem dada, dispus-me a ajudá-lo na sua difícil tarefa e lá o levei a casa do meu avô para que ele pudesse fazer um inventário como deve de ser do material que havia sido roubado no grande assalto a Tancos. É que não posso ver ninguém em aflição que o meu pobre coração fica logo comovido. Sou assim, que hei-de fazer?

“Então o que é? Vens cá buscar o material?”, perguntou-me o meu avô.

“Venho aqui com este soldado para ele poder elaborar o inventário do material que foi roubado dos paióis de Tancos, avô!”.

E diz o meu avô, “ee fosse a ti, levava também o material pois o capitão-mor, o Costa anda aflito com este caso e ainda há-de sobrar para mim! Ainda me tiram a minha mísera reforma”.

Eu vi logo que o meu velhote tinha toda a razão e telefonei logo para o Director desta coisa toda que me enviou logo um camião militar e uma dúzia de militares para carregarem o material roubado para um terreno abandonado na Chamusca antes que nos chamuscassem a mim e ao Director todo-poderoso e restantes amigos de farda, do Algarve ao Minho. Quando cheguei aos paióis, estava o meu capitão encostado à porta do assalto e disse-me, “olha, o assalto acabou!”.

Eu, surpreendido, “acabouu??”.

Disse-me o meu capitão, algemado por uns tipos mal-encarados, “acabou. Olha que veio cá o Director da PJ e prendeu o pessoal todo, prendeu-me também a mim e também te vai levar preso a ti!”.

Nota: Este texto foi inspirado na rábula “A História da Minha Ida à Guerra de 1908”, de Raúl Solnado.

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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