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Uma scooter endiabrada

Uma apologia a este velocípede nunca é tarde demais.
Com algumas estradas esburacadas, este dromedário de duas rodas superava qualquer dificuldade.
Petulante e emproada, esta scooter não nos dececionava.
Cansados de andar em estradas principais e com inúmeros socalcos de arroz à nossa volta, decidimos aventurar-nos por uma acanhada vereda.
O objetivo era apenas um.
Irmos à descoberta, tornando este passeio ainda mais pastoril.
Um desejo enorme de uma proximidade com a natureza, incitava-nos por caminhos raquíticos entre arrozais.
E do nada, eis que acontece o inesperado.
Sem qualquer tipo de trânsito e tendo passado com positiva em todos os testes de aritmética aplicada em circulação rodoviária, ouvimos subitamente um estrondo.
Quando olhei para trás, percebi que as nossas preces de podermos abraçar a natureza tinham sido ouvidas, mas mal interpretadas.
As nossas parceiras tinham caído da scooter e abraçavam o alcatrão.
Como uma bala, a Sandrina saiu disparada para ver se estava tudo bem.
A Sónia estava pálida e a Xana tinha a perna toda pisada e a sangrar.
Na verdade, a única que tinha tido uma aproximação com a tal desejada natureza era a scooter.
Numa valeta funda cheia de água, lá estava ela ainda com o motor ligado.
Como a união faz a força, passado um bom pedaço conseguimos tirar a scooter do buraco.
Apenas uns arranhões, mas nada de mais.
Com este pequeno susto e percalço, seguimos viagem num passo mais calmo.
Como unha com carne, o gelo tinha-se tornado o melhor amigo da Xana, que a cada paragem tratava da sua ferida.
Nesse mesmo dia chegámos à costa e decidimos pernoitar na cidade de Lovina.
8 euros foi quanto pagámos por um quarto mesmo ao pé da praia, com direito a pequeno almoço.
No dia seguinte seguimos viagem logo pela manhã.
Pelo caminho, inúmeros templos transbordavam entre arrozais e palmeiras.
Era impossível parar neles todos. 15032308_10207952969677692_6519851382893007167_n
O próximo objetivo seria chegar às aldeias que rodeiam o vulcão Batur.
De novo, o caminho fazia-se a subir com curvas bastante apertadas.
O que nos valia eram as fabulosas paisagens.
Passado algum tempo, avistávamos ao longe o vulcão Batur e Agung.
A cada instante, parávamos para fotografar este impotente fenómeno da natureza.
Seguindo o rasto a este vulcão, tínhamos subitamente diante de nós a sua cratera  e o lago Batur.
Ao longe, outro vulcão espreitava timidamente entre as montanhas.
A cada passo, a silhueta destes dragões ativos tornava-se ainda mais bela.
A estrada à volta do lago parecia mais um campo de minigolfe, pela quantidade abusiva de buracos que apresentava.
Com alguma compaixão do nosso querido velocípede, que já tinha tido a sua dose, decidimos não seguir caminho por estas estradas miseráveis.
No último dia, visitámos a zona de Ubud, famosa pelos seus magníficos campos de arroz.
Desta feita, decidimos encostar a scooter numa berma e percorrer a pé alguns caminhos bastante desengonçados e desconchavados.
Com a noite a espreitar, procurávamos ao longo da costa uma pousada.
Sendo tudo bastante caro, avançávamos de aposento em aposento até termos outra surpresa.
Quando dei conta, as minhas companheiras da outra scooter não estavam atrás de nós.
Preocupado, acelerei pela berma da estrada em contra mão, não tivessem elas caído novamente.
Mas nada disso. Desta vez a surpresa era ligeiramente diferente.
Tinham tido um furo e estavam paradas na berma da estrada.
Uma coisa é verdade. Estas meninas respiravam algum azar.
Um certo senhor que presenciou o sucedido, apontou para o outro lado da estrada, para repararmos o furo.
Quando lá chegamos, ficámos perplexos, pois estávamos diante de um salão de cabeleireiro e não de um mecânico.
Como este fulano, para além de ser cabeleireiro, também vendia alguns mantimentos, como bolachas e água, ainda achei que estávamos perante o homem dos sete ofícios e que nos ia reparar o furo.
Mas nada disso.
Pegou no telemóvel e fez uma chamada.
Após o telefonema mandou-nos aguardar, apontando para o relógio, e continuou a cortar o cabelo a um fulano como se nada fosse.
Passado algum tempo, chega um senhor de motorizada com tudo o que era preciso para reparar o pneu.
Dois euros e meio foi quanto custou uma câmara-de-ar nova mais a reparação.
Regressar a Kuta foi como voltar à estaca zero e eis que o famoso ditado “ depois da tempestade vem a bonança” se converte num “depois da bonança vem a tempestade.”
Após alguns dias de sossego e calma, estávamos novamente perante um trânsito louco e completamente absurdo.
Sem qualquer guia, ainda demorámos um bom pedaço para encontrar o local de entrega das scooters.
Mas esta é mesmo a magia e a essência deste tipo de viagens.
Sem qualquer trunfo, como num jogo de cartas, tentamos somar pontos a cada jogada.
Por vezes, também nós ficamos baralhados com situações adversas ao nosso quotidiano, mas no final acabamos sempre por vencer.
Aprendemos, crescemos e tornamo-nos pessoas com um olhar bastante diferente sobre um mundo tão mágico e misterioso.

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