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Sobre os empregados de mesa surdos

Se existe profissão que eu admiro porque sou completamente incompetente nesse aspecto, é o de empregado de mesa. E sou incompetente por duas ordens de razões: porque um tipo desastrado na utilização das mãos e porque tenho muita pouca paciência para aturar pessoas com a mania que são superiores e bêbedos! E também incompetente para sugerir um vinho.

Eu bebo uns copos valentes com amigos, mas recuso-me a aturar bêbedos chatos e agressivos, e lamechas, e com a mania de dar seca puxando assuntos que não me dizem nada mas em que eles são especialistas. Chatos do caraças!

Uma vez, havia um deles que me confundia com o meu irmão, achou que éramos muito amigos, e tínhamos vivido cenas juntos, e por mais que lhe garantisse que eu apenas o conhecia de vista, o gajo sentava-se na minha mesa e era um chato, mandava bocas às pessoas, tinha postura agressiva e obscena e uma noite, depois de me estar a chatear durante duas horas, eu disse-lhe que ia mudar de mesa, e que se voltasse a sentar-se perto de mim, eu dar-lhe-ia uma carga de porrada! Imaginem o meu estado de saturação, eu que nunca ando nem tenho jeito para andar à porrada! O tipo chamou-me ingrato, que tínhamos sido tão amigos e tratava-me pelo nome do meu irmão… certo é que nunca mais apareceu perto de mim. Nem está chateado comigo, está chateado com o meu irmão.

Também outro tipo dava-me seca, e garantia, completamente grosso, às duas horas da noite, que geria milhões de euros para aqui e para ali, e fazia isto e aquilo! Um dia perguntei-lhe porque é que ele falava comigo sobre isso e ele respondeu-me que gostava de falar de trabalho! Depois de eu lhe ter aconselhado a não falar comigo de trabalho às 2h da noite, que que me dava seca, e que me estava a marimbar para o que ele dizia, e se era para aturar bêbedos, alguém me teria de pagar as cervejas, o gajo deixou de me falar e foi pregar para outra freguesia.

Tenho um terceiro caso mais complicado, de um tipo que já fui amigo dele, mas que em puto tivemos uma desavença complicada, e sempre que está bêbedo e eu estou por perto, vem-me chatear a cabeça em tom desafiador. Eu finjo que não o ouço, ele fica numa mesa a rosnar e a mandar bocas. Felizmente raramente o encontro.

E se eu não tenho obrigação nenhuma em aturar bêbedos, a coisa fica mais complicada para quem está a servir cervejas e gins, e tem que gerir o estabelecimento, tanto mais que é proibido servir bebidas alcoólicas a quem está notoriamente embriagado, e depois o pessoal não quer sair, e é uma chatice. E eu não tenho paciência nenhuma para isso.

Mas há tipos que foram fadados para a restauração e lembro-me do Nei do D. Duarte II, ou senhor Batista que está há já uns anos no Manuel Júlio, ou o senhor Adriano que é meu amigo e abrilhanta o Rui dos Leitões, e tantos outros que fazem das minha refeições fora de casa, ainda mais deliciosas. E ontem voltei-me a encontra com o senhor “Pilinhas Meia Foda” que me recebeu com aquele sorriso cúmplice de alguém que já não vê o outro há mais de 20 anos.

Tenho amigos de infância que o são, uns tipos porreiros, que quando vou ao restaurante onde eles trabalham, é de grande abraço mas fico sempre com a dúvida de devo ou não deixar uma gorjeta a um tipo que é nosso amigo desde sempre. Mas claro que deixo, tanto mais que a gorjeta não é uma esmola, mas sim, o reconhecimento que fomos bem servidos e saímos do restaurante bastante satisfeitos.

E o clientes são muito chatos e eu já passei por uma experiência dessas uma vez! Estava eu numa festa que o meu pai promoveu para antigos colegas de profissão, eram para aí uns 100, e depois de almoço fui tirar a uma máquina Nespresso que estava em self-service um café. Por cortesia, ofereci o café acabado de tirar a uma senhora de certa idade, e o seguinte a outra senhora que a acompanhava, e depois apareceu um senhor idoso a dizer-me que queria um café curto mas com adoçante, e mal olhei mais para o fundo, estava uma fila de umas vinte pessoas, todas muito bem alinhadas, à espera que eu lhes servisse um cafezinho ou descafeinado, algumas com um “cheirinho” de aguardente. E fui servindo café a café, e a fila a aumentar, e descambou quando um tipo que estava no fundo começou a chatear-me a cabeça porque o serviço estava demorado, que eu era mau profissional, que se não sabia tirar cafés que desse lugar a outro, e eu dei… tirei um café para mim e fui-me embora.

Porém, eu tenho uma característica do pessoal de servir à mesa: sou um pouco surdo, ou melhor, existem sons que eu não consigo ouvir devido a um acidente em garoto que não me apetece contar-vos.

Talvez pela azáfama, talvez pelo barulho e burburinho das salas, normalmente uma pessoa pede sal, ou uma cerveja, ou a conta e os funcionários não ouvem. E estamos ali com o dedo no ar, e a dizer “por favor”, e ninguém nos ouve… tanto nos ouvem mal, que quando finalmente podem estar connosco um pouco e pedimos a factura, eles trazem-nos uma coisa chamada “Consulta de Mesa” ou “Talão de Controlo” que não tem nada a ver com uma factura.

Mas enfim, faz parte da praxe, e porque muita gente acha que sou maluco, e eu concordo com essa gente, comprei no Bazarão do Continente um microfone com duas colunas incorporadas, e com efeito de “eco” para parecer que estou a vender lençóis numa feira…. e vou-vos dizer uma coisa: resulta! Esta merda para armar confusão é do melhor.

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