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Ponte pedonal simboliza união com Espanha no Festival do Contrabando de Alcoutim

A segunda edição do Festival do Contrabando de Alcoutim vai começar na sexta-feira, com a ponte pedonal sobre o rio Guadiana como “símbolo” da “união” entre a vila algarvia e a localidade espanhola de San Lucar, disse o presidente da Câmara.

O presidente da autarquia algarvia, Osvaldo Gonçalves, falou com a agência Lusa sobre o festival que se realiza até domingo, e explicou que a iniciativa procura “conquistar espaço no âmbito dos grandes eventos que se realizam no território do Baixo Guadiana, como são a montante o festival Islâmico de Mértola e, a jusante, os Dias Medievais de Castro Marim”.

Osvaldo Gonçalves disse que, apesar de apostar na mesma “tipologia de evento”, o festival está “ancorado na história”, tem a ver “com a raia e as questões do contrabando” e “toda a dinâmica do que foram os tempos do contrabando estará, de uma forma ou outra, ao longo dos três dias, espelhada num conjunto de atividades” programadas com apoio do programa 365 Algarve.

“A ponte irá de alguma forma simbolizar a vontade dessa aproximação e da união destas duas margens e territórios, que sofrem problemas comuns e onde há também uma vontade comum” de os ultrapassar, justificou o presidente do município do distrito de Faro.

Os objetivos passam também por “dar a conhecer aos mais novos as dificuldades que foram ultrapassadas no passado, com recurso a esta prática do contrabando”, que era “uma prática de sobrevivência” e servia para “colocar pão em cima da mesa das suas famílias”, e por “homenagear” tanto os contrabandistas com os Guardas Fiscais, acrescentou o autarca.

Américo Rodrigues, 80 anos, viveu os tempos de contrabando quando ainda era criança, antes ir para Lisboa trabalhar, regressou na reforma a Alcoutim e disse à Lusa que os contrabandistas “passavam deste lado [Portugal] para aquele [Espanha] com as cargas”.

“Estava aqui um guarda nesta guarita e, quando faziam a mudança de guarda e ele ia daqui para lá [para o posto trocar com um colega], alguns passavam mesmo aqui ao cais com a carga às costas e a nadar”, recordou, precisando que, quando chegavam ao destino, “entregavam, recebiam o dinheiro e vinham-se embora”.

Américo Rodrigues considerou, no entanto, que essa vida “era uma miséria” e os contrabandistas “passavam uma ‘cargazita’ para ganharem alguns tostões”, porque muitos deles “não tinham trabalho” e “não havia mais nada” para ganhar a vida, “além de tirar peixe do rio”.

Quem se lembra bem de como eram os tempos do contrabando na zona raiana do Baixo Guadiana, aos 83 anos, é Francisco Manuel Gonçalves, conhecido como “Ti Chico”, que recordou à Lusa como trabalhou duas semanas no transporte de café, que era ilegal, para Espanha.

“Abalávamos daqui com 35 quilos às costas até Gibraleão [Huelva, Espanha], pregando às vezes cabeçadas nos pinheiros secos que havia além na Espanha, e por onde havia o maior mato era por onde um gajo passava. Só passavam ali os bichos bravos por aquele mato e, volta e meia, púnhamos um pé dentro de uma poça de água e íamos todos molhados, para ganhar nessa altura 110 escudos”, contou.

Francisco Gonçalves comparou o valor que recebia à chegada a Gibraleão, após cerca de 70 quilómetros de distância e duas noites de viagem, com os 10 escudos que “andavam eles aqui ganhando, atrás de uma parelha, lavrando de manha à noite”.

“Levava uma noite ou duas só pelo meio daqueles matos. Era uma vida lixada”, reconheceu Ti Chico, frisando que depois a “sogra começou a meter medo” e deixou a atividade, cuja memória a autarquia agora quer recuperar com o Festival do Contrabando.

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